A Assembleia Legislativa de Santa Catarina (Alesc) deve criar um grupo de trabalho para acompanhar os desdobramentos da audiência pública que discutiu o uso da cannabis medicinal no tratamento de doenças crônicas. O encontro, promovido pela Comissão de Saúde na noite de segunda-feira (25), reuniu autoridades, profissionais da saúde, pesquisadores, associações, pacientes e familiares.
Entre os principais encaminhamentos estão a capacitação de profissionais da saúde para o uso terapêutico da planta, a possibilidade de parcerias entre o poder público e associações canábicas, além da viabilização do cultivo da cannabis pela agricultura familiar, com foco na produção de medicamentos.
Parlamentares destacam avanços e dificuldades
A audiência foi proposta pela deputada Paulinha (Podemos), que defendeu maior acesso ao tratamento. “Precisamos garantir que esse medicamento chegue a quem realmente precisa e não tem condições de pagar”, afirmou. Ela destacou que, apesar de Santa Catarina contar com uma das legislações mais modernas do país sobre o tema, ainda há entraves como o desconhecimento médico, falta de financiamento e dificuldades na produção dos medicamentos.
Paulinha se referiu à Lei Estadual nº 19.136/2024, que institui a Política Estadual de Fornecimento Gratuito de Medicamentos à Base de Cannabis, regulamentada por decreto em maio. No entanto, o deputado Padre Pedro Baldissera (PT) criticou o decreto regulamentador, alegando que ele limita o acesso ao canabidiol ao condicionar a distribuição à avaliação de uma equipe técnica. “A prescrição médica já deveria ser suficiente para garantir o acesso ao tratamento”, argumentou. O parlamentar propôs a suspensão do decreto.
Por outro lado, o secretário de Estado da Saúde, Diogo Demarchi Silva, defendeu a regulamentação e afirmou que o governo está empenhado em viabilizar a aplicação da lei. “A Secretaria está aberta ao diálogo. Queremos ouvir a sociedade e seguir com os encaminhamentos necessários”, declarou.
Depoimentos emocionam e reforçam importância do debate
A audiência contou também com a participação do deputado Marquito (PSOL) e de representantes de associações, universidades, médicos e familiares de pacientes. Diversos relatos mostraram os efeitos positivos do uso medicinal da cannabis em casos de fibromialgia, autismo (TEA), Alzheimer, Parkinson e epilepsia.
Médicos ressaltaram que há evidências científicas que comprovam a eficácia dos compostos canabinoides no tratamento de diversas enfermidades. Universidades, por outro lado, relataram insegurança jurídica para conduzir pesquisas na área, o que representa um entrave à produção de conhecimento e inovação.
Um dos momentos mais comoventes da audiência foi o depoimento de Daiana Barcelos, mãe de uma menina com epilepsia. Segundo ela, a filha apresentou melhoras significativas após iniciar o tratamento com canabidiol — chegando a abandonar a cadeira de rodas. No entanto, ao ter o fornecimento do medicamento suspenso por decisão judicial, a criança enfrentou as crises mais graves da vida. A decisão foi posteriormente revertida.
“Minha filha voltou a andar, mas quando ficou meses sem o medicamento, sua condição piorou drasticamente”, relatou. Daiana também liderou uma campanha que arrecadou R$ 350 mil para a compra de um equipamento de purificação, permitindo a produção de compostos específicos à base da planta.